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Candidatura velada – Felipe Lemos faz análise da política externa brasileira


Por marciobasso 04/08/2010 - 09h16
 
“Nenhuma das mortes é confortável”. A frase tem sua origem no presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que ouvi ontem no noticiário. Vamos ao contexto.
 
O presidente disse a frase ao se referir à mulher iraniana que foi condenada à morte recentemente por manter relações sexuais (consideradas ilícitas pelo governo do Irã) após a morte do marido. O Brasil sinalizou com a possibilidade de conceder asilo a esta mulher para que não seja enforcada ou apedrejada conforme as leis iranianas. Pelo menos foi o que deu a entender o próprio presidente da República.

Sem dúvida, parece ser uma atitude de compaixão digna de um estadista. E ninguém, pelo menos no ocidente, provavelmente vá se opor a este tipo de demonstração pública de preocupação com um ser humano que pode padecer por causa de uma legislação que, a nosso ver, não tem qualquer base ética ou cristã.
O que está por trás desta e de outras expressões de preocupação internacional do governo brasileiro é que precisa ser lido nas entrelinhas. Não é a primeira vez que Lula resolve agir publicamente no cenário mundial a fim de intervir em questões sem relação direta com o Brasil. Recapitulemos.
No episódio do enriquecimento de urânio pelo Irã e a discussão com a Turquia, Lula surgiu, amparado por seu corpo diplomático, como um mediador infalível. À primeira vista, estava tudo resolvido. Tendo Lula como avalista, o Irã iria mandar parte do urânio para ser enriquecido na Turquia e o possível risco de utilização do elemento para fins bélicos poderia estar longe. Só que os outros países como Estados Unidos e França simplesmente não acreditaram em Mahmoud Ahmadinejad, muito menos em sua retórica de bom menino. E o papel de Lula ficou amarelado.
Mais perto de casa, o presidente brasileiro resolveu se intrometer nos assuntos internos de Cuba. Com seu hábito de dar opinião sobre tudo o que lhe vem à mente, o candidato a estadista-chefe das Américas diz o que pensa sobre libertação de presos políticos no país controlado por Castro e seu irmão há décadas. Agora, mais recentemente, colocou-se à disposição para ser o mediador no litígio entre Venezuela e Colômbia, de relações cortadas por conta do ímpeto do presidente venezuelano Hugo Chávez.
Superficialmente, a explicação para tanto interesse de Lula por questões internacionais se limitaria ao desejo de perpetuar lucrativos acordos comerciais com todos estes países, a boa intenção de ajudar e mesmo por ser o Brasil um país em franco crescimento econômico e, portanto, estratégico na geopolítica mundial. Tudo isso explica, mas não justifica.
Talvez Lula seja candidato a cargos internacionais e tudo isso faça parte, também, de um bem montado planejamento para se alcançar este objetivo.
Afinal de contas, na impossibilidade de tentar um terceiro mandato em seu próprio país, o negócio, de repente, poderia ser o de partir para a administração além-fronteiras a partir da ONU. Se for o caso, é bom levar em conta que este tipo de prática já desgastou presidentes norte-americanos.
Os Estados Unidos são um bom mau exemplo do que resulta em se chamar para si a tarefa de gerenciador oficial dos conflitos mundiais. Sua intervenção de quase uma década no Iraque não tem servido de modelo para ninguém e ganha poucos adeptos dentro e fora dos limites estadunidenses.
Imagino que o presidente tenha assessoramento capaz de preveni-lo de tais erros e equívocos. Uma coisa é aplicar suas habituais metáforas e seu jeito popularesco de liderar para tudo o que acontece aqui dentro do Brasil.
Outra, bem diferente, é pensar que este estilo vai emplacar em toda e qualquer questão internacional. Como diz o ditado, lá o buraco é mais embaixo.
Felipe Lemos é jornalista