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Lifestyle Letters: “Doenças Cardiovasculares e o Estilo de Vida: papel do exercício aeróbico”

DOENÇAS CARDIOVASCULARES e ESTILO de VIDA: Insuficiência cardíaca decorrente de Infarto do Miocárdio e o papel do exercício aeróbio.

Vida e Saúde


Por vidaesaude 27/08/2020 - 10h13
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Autores: Leslie Andrews Portes e Natália Cristina de Oliveira

1. Doenças do Estilo de Vida

As principais causas de óbitos no mundo são denominadas, em conjunto, de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), ou Doenças Não Comunicáveis. Esse grupo de doenças é responsável por 70% de todas as mortes no mundo (Portes, 2011). As DCNT incluem, em ordem de ocorrência, a maioria das doenças cardiovasculares, dos cânceres, das doenças do aparelho respiratório e o diabetes mellitus. Os mais importantes fatores de risco para essas doenças incluem uso de fumo (em suas diferentes formas), dieta não saudável, falta de adequada atividade física, uso perigoso do álcool, os quais, se relacionam ao sobrepeso, obesidade, elevada pressão arterial e hipercolesterolemia. Visto que esses fatores de risco estão fortemente relacionados ao Estilo de Vida, as DCNT também têm sido chamadas de Doenças do Estilo de Vida (Pappachan, 2011). Além disso, esses fatores de risco têm sido amplamente estudados por serem modificáveis, ou seja, quando não praticados o resultado é redução ou desaparecimento.

Quando se tem em mente a definição de Estilo de Vida, da Organização Mundial da Saúde (Portes, 2011), como “o conjunto de hábitos, costumes e práticas que um indivíduo ou uma coletividade realizam”, é possível supor que a responsabilidade por essas doenças seja deles. Contudo, não se deve desconsiderar que tais hábitos, costumes e práticas sejam “influenciados, modificados, encorajados ou inibidos pelo prolongado processo de socialização”, como estabelecido pela própria Organização Mundial da Saúde (WHO, 1998). Portanto, não é correto concluir que a responsabilidade pelas Doenças do Estilo de Vida seja do indivíduo ou da coletividade. Na verdade, essa conclusão é, no mínimo, precipitada, dada a complexidade do Estilo de Vida, e pode prejudicar mais que ajudar, pois é, em si mesma, antipática e preconceituosa (Andersen e Nielsen, 2016). Em outro extremo, não se deve supor que, embora seja difícil enfrentar as forças sociais, em última instância, é o indivíduo que decidirá o que fará com sua vida, que hábitos, costumes e práticas cultivará.

2. Infarto do Miocárdio

O infarto do miocárdio (IM) é um evento súbito e agressivo, decorrente, na maior parte das vezes, da interrupção, parcial ou total, do fluxo sanguíneo coronariano. A oclusão coronariana é o principal desencadeador do IM. Após a interrupção do fluxo de sangue, desencadeiam-se fenômenos nas células miocárdicas, os cardiomiócitos, que levam à progressiva perda de função e ao remodelamento. Entre as alterações funcionais mais destacadas ocorrem redução da contratilidade e do relaxamento miocárdicos, que levam à incapacidade das câmaras cardíacas se encherem e se esvaziarem. O prejuízo do enchimento, especialmente do ventrículo esquerdo, leva à congestão de sangue nas veias pulmonares e, daí, aos vasos sanguíneos pulmonares, resultando em congestão pulmonar e edema pulmonar. Essa seria uma das explicações para a sensação de dispneia típica em pacientes infartados, especialmente entre os que desenvolvem insuficiência cardíaca (IC). O prejuízo do esvaziamento cardíaco, conhecido como ejeção ou sístole, leva à incapacidade do coração bombear sangue ao corpo. Os resultados incluem redução do consumo de oxigênio, incapacidade do coração abastecer de sangue os tecidos e fadiga em esforços mínimos. Esses são outras das principais características de um paciente com IC decorrente do IM. O remodelamento inclui dilatação do ventrículo esquerdo e hipertrofia do miocárdio que não foi afetado pelo IM.

3. Insuficiência Cardíaca

Como dissemos atrás, as alterações funcionais e morfológicas do coração após IM podem levar à insuficiência cardíaca que, como o termo diz, é a incapacidade do coração, como bomba, atender às necessidades dos tecidos e órgãos com adequado e contínuo suprimento de sangue. Os principais sinais e sintomas de um paciente com IC incluem: dispneia, fadiga em pequenos esforços e baixo consumo de oxigênio, o que afeta negativa e drasticamente a qualidade de vida do paciente.

4. Estilo de Vida

Visto que as doenças cardiovasculares estão fortemente relacionadas a vários aspectos do Estilo de vida, essas sempre foram as principais recomendações não farmacológicas. Dieta adequada, redução do estresse, cessação do tabagismo, drástica redução do etilismo, controle do peso, da pressão arterial e da glicemia, entre outras. O exercício físico nem sempre foi indicado para pacientes com IC decorrente IM. Vários pesquisadores e clínicos mencionavam o receio que tinham de exacerbação dos sintomas e da doença em função da prática de exercícios físicos (Clausen et al., 1976; Smith et al., 1988, Uren e Lipkin, 1992; Alzaf et al., 1998). Hoje, não há mais dúvidas de que, junto com a dieta saudável, o exercício físico é a principal forma não farmacológica de prevenção e tratamento da doença.

5. Exercício Físico Aeróbico

No Laboratório de Fisiologia Cardíaca e Fisiopatologia Cardiovascular da UNIFESP, desenvolvemos um longo protocolo de estudos objetivando avaliar se o exercício físico seria capaz de aumentar a sobrevivência de ratos submetidos a IM que resultasse em IC.

5.1. Método

Foram estudadas 120 ratas divididas em 2 grupos: 60 ratas sedentárias (SED) e 60 ratas exercitadas por meio de natação (TR). Após adequada anestesia, todas foram infartadas e, depois de 21 dias de recuperação, foram sorteadas para um dos 2 grupos e submetidas aos exames de EcoDopplercardiografia e medida do consumo máximo de oxigênio (VO2 máximo). Após isso, as ratas TR foram submetidas a 60 minutos de natação, 5 dias por semana, até que um dos grupos atingisse 50% de óbitos. Ao final do protocolo experimental, todas as ratas foram submetidas aos mesmos exames, sempre com adequada anestesia, quando necessário, além de medidas hemodinâmicas, por meio de cateter Millar, foram submetidas a exames histológicos, biométricos e da mecânica miocárdica “in vitro”.

5.2. Resultados

m média, os 2 grupos tinham IM que abrangia 50% do ventrículo esquerdo, o que é considerado grande IM. Ambos os grupos não diferiram com relação à sobrevida. Isso provavelmente ocorreu porque desenvolvemos uma técnica nova de promoção do IM que não reproduz exatamente as alterações verificadas pela técnica tradicional durante os 21 dias de recuperação. Essa técnica, chamada de ablação, causa instantânea necrose tecidual e nos permite determinar exatamente o tamanho do IM que se deseja. Contudo, as alterações decorrentes do IM foram as esperadas.

As medidas EcoDopplercardiográficas não diferiram entre SED e TR. Em ambos os grupos, o IM resultou em dilatação do ventrículo esquerdo, alteração no formato cardíaco, claros sinais de prejuízos do enchimento e do esvaziamento do ventrículo esquerdo.

As medidas hemodinâmicas também não foram diferentes entre os grupos, mas indicaram que o IM causou aumento da pressão diastólica final, indicativa de IC

A mecânica miocárdica foi deprimida pelo IM seguido de IC, mas, novamente, as ratas SED não diferiram das TR.

Contudo, ao serem avaliados os resultados do VO2 máximo, melhor indicador de aptidão cardiorrespiratória, as ratas SED terminaram o protocolo, em média, com 40 ml/kg/mino de consumo máximo de oxigênio, enquanto que as ratas submetidas a natação moderada encerraram com 54 ml/kg/min em média. Essa diferença foi 35% maior nas ratas TR.

5.3. Conclusão

O exercício físico por natação para ratas portadoras de IC decorrente do IM aumenta a aptidão cardiorrespiratória, mesmo na ausência de outros benefícios cardíacos e hemodinâmicos.

Referências bibliográficas

Portes LA. Estilo de Vida e Qualidade de Vida: semelhanças e diferenças entre os conceitos. Lifestyle J, 2011; 1(1):8-10.

Pappachan MJ. Increasing prevalence of lifestyle diseases: high time for action. Indian J Med Res, 1998;134:143-5.

Andersen MM, Nielsen ME. Personal Responsibility and lifestyle diseases. J Med Phil, 2016;41: 480-99.

Clausen JP. Circulatory adjustments to dynamic exercise and effect of physical training in normal subjects and in patients with coronary artery disease. Progress in Cardiovascular Diseases, 1976;18(6): 459-95.

Smith TW, Braunwald E, Kelly RA: The management of heart failure, in Braunwald E (ed): Heart Disease, A Textbook of Cardiovascular Medicine. Philadelphia, PA, Saunders, 1988, pp 485-489.

Uren NG, Lipkin DP. Exercise training as therapy for chronic heart failure. Br Heart J, 1992;67:430-3.

Alzaf A, Brawner CA, Keteyian SJ. Exercise training in heart failure. Pogress in Cardiovascular Diseases, 1998:175-190.